Há quatro dias uma pessoa me ligou indicada por um dos nossos clientes de longa data, era mais um daqueles pedidos de ajuda comum para quem trabalha com cães, até aqui tudo normal, mas uma observação chamou minha atenção: “sou amigo do ‘fulano’ e eu gostaria que a minha cachorra fosse igual a Mel… A Mel é uma das cachorras mais educadas e treinadas que eu ja vi”.
Óbvio que fiquei orgulhoso, ela hoje deve ter 3 anos e a Mel recebe elogios por onde vai desde os 6 meses de idade, ela é um dos vários cães que já viveram a experiência do Matilhando Puppy Class e tornaram-se cães adultos equilibrados. Inevitavelmente lembrei das aulas, da parceria com os donos, do cronograma justo para aproveitar plenamente a fase do desenvolvimento dela, das aptidões e das traquinagens.
Refletindo sobre a Mel fiz um paralelo sobre meus atendimentos de Goldens e vou compartilhar aqui.
Atendi vários Goldens com problemas de agitação excessiva , reatividade e agressividade por posse e/ou proteção de recursos. Atendi esses lindos cães que infelizmente apresentavam uma variação gigantesca de comportamentos indesejados e não dava para formar um padrão de problemas comportamentais, como consegui mapear em relação aos Borders Collies (veja o artigo aqui), no caso dos goldens havia de tudo. O único padrão que eu podia identificar durante a consulta comportamental destes cães era o comportamento dos próprios donos.
Se uma pessoa se comportava de um modo específico, a resposta do cachorro era a mesma, havia esse padrão mesmo em famílias diferentes, completamente desconhecidas entre si. E eu tenho uma teoria sobre isso baseada nas minhas análises e experiência.
Um panda de pelo amarelo
Em muitos casos quem é dono de Golden não o enxerga como um cão, ele é uma pelúcia, um ursinho, um bebezinho, ele é qualquer coisa, mas não um cão. Às vezes, a pessoa tem um Golden por causa daquele esteriótipo do cachorro que aparece correndo numa manha típica de comercial de margarina, o cenário é lindo, mas só na cabeça da pessoa porque a realidade é algo completamente diferente.
Criou-se em torno da raça um romantismo absurdo que é um verdadeiro engano comparada a responsabilidade de criar um Golden e, como todo “bom” romantismo não anda sozinho, junto a ele vem uma quilométrica e densa expectativa sobre o cão e o que ele pode dar ao ser humano em termos de bem estar.
O primeiro problema surge quando o recém dono de Golden decide conversar com um dono mais experiente sobre a raça, um dono já mais antigo que conhece os Goldens e num primeiro momento também idealizou para si aquele cão do comercial de margarina, ele diz: “já estou no meu quinto Golden, eles são assim mesmo, Golden é estabanado, quebra tudo, destrói a casa, não consegue ficar sozinho, eles só fazem aquilo o que querem e se tem alguma coisa que eles gostam provavelmente não vão te ouvir, mas ó, ele fazem isso do jeito mais fofo e gracioso que existe!”.
Como status do Golden é de bonachão, naturalmente bonzinho, algumas pessoas parecem aceitar qualquer comportamento errado que eles apresentem, exceto aquele que contraria o esteriótipo: “ele não aceita outros cães” ou “ele é agressivo em alguns momentos, já me mordeu por causa de comida” aí o relato choca.
Eu atendi vários Goldens reativos com pessoas e outros cães e alguns deles com episódios de agressão.
A minha pergunta é: por que os Goldens são negligenciados como cães?
Goldens são cães extremamente inteligentes e conectados com os donos, eles são fascinados por realizar alguma atividade para agradar seus donos, sua família, mas a falta de orientação correta tem tornado um dos melhores cães de família em animais doentes, seja no âmbito físico decorrente do estresse contínuo por agitação excessiva, seja nas síndromes e distúrbios comportamentais decorrentes do desequilíbrio psicológico.
Eu sei que muitas vezes a razão pela qual adquirimos qualquer cão tem raízes nas nossas emoções, nas mais puras, eu respeito isso de coração, a minha intenção não é julgar você que talvez esteja errando com o seu dog, mas ajudá-lo a encontrar o melhor caminho para a relação de vocês – de modo que você tenha uma animal equilibrado e feliz.
Nós podemos tirar um cão da natureza, mas jamais podemos tirar a natureza de dentro do cão, seu Golden ainda se importa com as coisas mais básicas da vida animal de um cão: como caminhar e viver a vida sob um estado mental calmo.
Lembre-se que o seu cão embora hoje tenha status de um cão de companhia, originalmente foi concebido para o trabalho e isso ainda está presente no DNA dele e é por isso que ele traz as suas meias, seus chinelos, e suas roupas para chamar a sua atenção. Essa aptidão para o trabalho do Golden um cão incrível para aprender coisas novas.
Aproveite a capacidade, a inteligência e as aptidões do seu Golden para direcioná-lo para o melhor! Dedique tempo para ensinar bons comportamentos para o seu cão, peça ajuda a um profissional sempre que precisar, mas não acredite no esteriótipo do cachorro agitadão e que pra ser Golden tem mesmo que aprontar, quebre o ciclo e não permita que o seu cachorro carregue um rótulo injusto de cachorro naturalmente maluco.
A felicidade de um cão não tem a ver com agitação, mas com um cachorro pleno e satisfeito.